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Alta do dólar pode ter efeito ''bomba'' sobre inflação

Lu Aiko Otta e Fabio Graner A alta do dólar ocorrida desde o agravamento da crise financeira pode ser uma bomba-relógio para o governo. Na avaliação do Banco Central (BC), o encarecimento da moeda americana, que já chega a 43,6% desde o fim de agosto, praticamente não foi repassado para os preços no mercado interno. O temor é que, a partir do início do ano que vem, isso comece a ser feito - embora as autoridades admitam que não sabem qual a rapidez ou a intensidade desse processo. Tanto pode ser uma marolinha, como algo que impeça o cumprimento da meta de inflação e prejudique o processo de redução dos juros para estimular a recuperação da atividade econômica. O repasse cambial é um dos três principais riscos para a estabilidade dos preços em 2009, segundo constata o Relatório de Inflação divulgado na semana passada. O documento tem um capítulo dedicado ao tema, marcando uma inflexão por parte da autoridade monetária, que, até pouco tempo atrás, não enxergava com preocupação o problema do repasse do câmbio para os preços. Na ala desenvolvimentista do governo, inclusive, há quem aponte essa nova preocupação do BC como apenas um meio de manter um discurso conservador na gestão da política monetária. As outras duas fontes de incerteza apontadas no Relatório de Inflação para o controle de preços são: a duração e a magnitude da crise internacional e o tamanho da desaceleração da economia brasileira. "O acompanhamento da evolução dos preços ainda não mostra repercussão significativa da depreciação da taxa de câmbio", diz o Relatório de Inflação. "Entretanto, é importante destacar a existência de um risco associado à defasagem entre a variação cambial e sua repercussão sobre os preços ao consumidor." Para o ex-diretor do Banco Central Carlos Eduardo de Freitas, o risco de um repasse da desvalorização do real para os preços existe e "tem importância". Ele argumenta que este perigo existe porque a economia brasileira vinha crescendo a uma velocidade grande até há pouco tempo, o que pode facilitar a transferência do custo cambial para os preços ao consumidor. O economista lembrou que na maxidesvalorização de 1999, o repasse do câmbio para os preços não foi tão grande porque a economia brasileira já vinha desde 1997 em um processo de desaceleração. Segundo Freitas, a contrapartida dessa análise é o fato de que desde o agravamento da crise, em setembro, a economia brasileira começou a frear, o que é um fator que inibiria repasses. "O problema é que ninguém, nem o BC, sabe o que vai pesar mais. Por isso, a preocupação do BC com o câmbio tem sentido", afirmou o ex-diretor. Na visão dele, o BC vai enfrentar um dilema entre evitar o repasse da desvalorização e evitar uma queda muito grande da atividade econômica em 2009. O economista-chefe da consultoria LCA, Francisco Pessoa, tem uma avaliação mais otimista e acha que o risco de repasse da alta do câmbio é pequeno. Primeiro, porque ele acredita que a tendência do preço do dólar é cair daqui para diante. Depois, porque a economia vai esfriar em 2009, com a taxa de desemprego passando de 7,9% este ano para 8,4% no ano que vem. Isso deixaria menos espaço para elevar preços. O câmbio em alta é, também, contrabalançado pela queda no preço das commodities. "Esses fatores indicam que o risco de repasse forte para a inflação é pequeno", disse. "Não é uma ameaça ao cumprimento da meta." O Relatório de Inflação reconhece os argumentos de um lado e de outro, sem chegar a uma conclusão. Defende, porém, que a atuação do Banco Central no sentido de manter a inflação dentro da meta ajuda a evitar o problema. "A consolidação de instituições monetárias e fiscais, com destaque para o regime de metas para a inflação, pode atuar no sentido de amortecer o repasse." Estudos citados no Relatório mostram que, quanto maior é a confiança dos agentes econômicos na postura da política monetária - ou seja, percepção de compromisso com inflação baixa -, menor é o repasse cambial. A favor da perspectiva de um comportamento mais controlado dos preços, pesa o fato que a atual elevação do câmbio é diferente da verificada em 2002. Na véspera da eleição presidencial, investidores foram tomados pelo pânico, temendo uma mudança na política econômica brasileira. Nesse quadro de insegurança, o risco de repasses fortes da alta do câmbio eram maiores do que hoje. Por outro lado, o Relatório lista como fatores que aumentam o risco de repasse o fato de a economia brasileira estar, até há pouco tempo, em crescimento acelerado. Segundo mostram estudos citados pelo BC, nesse quadro o risco de aumento de preços em função da alta do dólar é maior. Outro fator de preocupação é que, ainda que o repasse do câmbio seja pequeno, o efeito sobre a inflação não é desprezível.

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